23 de agosto de 2012

Desafios

Tomei uma decisão audaciosa na vida: resolvi encarar definitivamente as aulas de canto. Atividade comum para uns, mas uma epopeia para mim, que sempre deixei de lado muita coisa boa para me dedicar aos estudos e trabalho. Enfim, essa parte da história quem convive comigo já conhece e dependendo do que já experimentou até aqui vai contar sua própria versão utilizando verbos no passado, presente ou futuro.
 
A odisseia se inicia com o sofrimento desencadeado pelo lado racional de incluir uma atividade supérflua numa rotina que abrange questões sérias como a realização do Doutorado, as aulas de Pilates, o projeto com a COPPE e o tempo disponível para o lazer e para conviver com meus amores. Essas atividades são extra-laborativas, e por isso são distribuídas de segunda a sexta no período entre 17h e 21h, e aos sábados e domingos em tempo integral. Minha agenda ainda não está devidamente organizada para isso, mas estou deixando o Universo atuar.
 
E nas duas aulas que já fiz, novamente me deparei com uma lei máxima dessa entidade infinita que é tão clara quanto as que Newton psicografou para o mundo macroscópico que conhecemos: para mudar é necessário realizar trabalho que traz uma sensação de desconforto. Bem, tenho adorado a elegância, tranqüilidade, respeito e exercícios do professor. Os vocalizes que tenho exercitado às vezes me parecem cânticos nunca ouvidos, pois já tive a impressão de que estava entoando um lamento indígena através de um simples ôiôiô. Outras vezes reconheço como trechos de canções que já ouvi. É porque minha cabeça funciona assim, procurando metáforas e analogias para se expressar e se divertir.
 
O instrumento utilizado nas aulas é um piano, sem cauda, mas com tamanha beleza e imponência. E quando vamos percorrendo as escalas acompanhadas de encontros vocálicos me deparo com o desconhecido. Meu canto é uma expressão muito simples do que outros cantam, mas nas aulas, tenho que ouvir apenas um instrumento. O professor, nesse ponto, se deliberadamente ou não, me deixa sozinha, me entendendo com aquele novo amigo. Suas intervenções são mínimas, ele apenas me acompanha na primeira vez, depois, só eu e meu corpo tentando encontrar uma solução para tal equação. Estou habituada a referências vocálicas, o instrumento sempre foi secundário, meu jeito de aprender é olhando um quadro, realizando inúmeras anotações. Nesses vocalizes é tudo muito abstrato, não vejo notas, não leio nem escrevo, não tenho um guia, canto diferente, não me reconheço. No final sempre cantamos alguma canção, mas acho que já estou tão desequilibrada com a reconstrução que não me sinto à vontade com canções já entranhadas em minha voz. A estranheza e o desconforto são tão gritantes que nem a afirmação do professor de que minha voz é do estilo Marisa Monte me fez sentir orgulho ou vontade de contar para alguém sobre essa descoberta.
 
Com isso tudo, penso que nenhum outro momento da minha vida seria melhor para vivenciar esse processo. Não estou irritada, tenho imensa vontade e alegria de ir às aulas, vou preparar um novo repertório, vou exercitar pop rock, bossa nova e mpb. Na minha vida, aprendi a estudar. Conheço bem meu desempenho após uma prova, minhas limitações, minhas facilidades, pessoas e livros para recorrer. Agora, vou aprender a cantar. E o cantar samba, que era o objetivo principal dessa história, vai surgir na hora certa, vai sair saboreado e compreendido como nunca.
 
 

4 comentários:

  1. Adorei tudo isso. Saber que vc está nas aulas de canto e toda essa reflexão.Toda essa descoberta.

    Incrível como somos surpreendentes e não nos conhecemos. Eu, no Pilates, estou descobrindo que tenho músculos que jamais sonhei que existiam.

    Vc, no canto, descobrindo e experimentando novas frequências jamais alcançadas.

    Como viver é divertido quando estamos aprendendo, não?

    Parabéns pelo texto.

    Bjs

    LK

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  2. Olá! Obrigada pelo carinho LK! Realmente é mt bom!!! Descobrir e aprender é uma dinâmica prazerosa! Parabéns pela insistência no Pilates tb!!!!

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  3. Muito bom amor.
    Muito bom também saber que está gostando das aulas.

    Beijocas

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  4. Oi amor! Que bom que gostou do texto! bjs mil

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